Metáforas na dissertação
Uma dúvida comum entre os alunos é se podem, ou devem, usar linguagem figurada no texto dissertativo. O emprego de figuras não é proibido, mas o ideal nesse tipo de texto é privilegiar a denotação, ou seja, usar as palavras em sentido próprio. A linguagem conotativa apresenta os seus riscos.
Um deles é gerar imprecisões, como neste exemplo: "Devemos sempre buscar as taças de aprovação saudáveis para o equilíbrio emocional." O emprego de "taças" nessa passagem soa vago, arbitrário. Não existe nexo entre a metáfora escolhida pelo aluno e o que ele pretende designar. O uso de um termo como "níveis" seria mais apropriado.
Outro risco da linguagem conotativa é dar margem a lugares-comuns, representados geralmente por metáforas fossilizadas. Dois exemplos:
- "Em um cenário marcado pelo fantasma da impunidade e onde o dinheiro compra quase tudo, é extremamente fácil a formação de novos delinquentes";
- "O mundo em que vivemos não é um mar de rosas; o perigo nos espreita a cada esquina".
As imagens grifadas, de tão batidas, já não provocam nenhum efeito. São por demais previsíveis, e com isso perdem justamente o que as justificaria como imagens: a novidade.
Se uma metáfora imprecisa compromete a expressão das ideias, que dizer de duas ou mais? Um de nossos alunos usou três na conclusão de um texto sobre ideologia e solidariedade. Escreveu: "É preciso que o homem disponha de todas essas "injeções" ideológicas a fim de que, pelo menos, poucos mililitros de solidariedade sejam inseridos nas veias da consciência humanitária."
A intenção foi boa; "injeções", "mililitros" e "veias" vinculam-se a um mesmo campo lexical -- o campo médico-hospitalar -- e até poderiam compor uma alegoria (nome que se dá às metáforas em cadeia). No entanto, há incompatibilidade entre a natureza dos elementos comparados e a dos comparantes. Não dá para quantificar em "mililitros" a solidariedade; e a consciência é um domínio por demais abstrato para ter "veias".
Embora seja pertinente falar em "injeções ideológicas", a tentativa de expandir essa metáfora se revelou forçada e mesmo caricatural. Terminou chamando demais a atenção e prejudicando a transparência das ideias. O aluno faria melhor se tivesse optado pela denotação e escrito: "É preciso que o homem disponha de estímulos ideológicos para que a solidariedade penetre em sua consciência." Simples e claro, não?
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